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Artigo: Papai Noel é um Monstro - por Clístenes Hafner Fernandes

Quase todos os pais são extremamente bem-intencionados quando se trata da educação dos filhos. Pode ser que haja muita gente preguiçosa e desleixada, mas de boas intenções estamos com saldo positivo. Há, porém, um drama pelo qual a maioria das famílias passa: contar a verdade sobre o Papai Noel. Para alguns é traumático, para outros, desimportante. E é assim porque não há em nós a chave interpretativa que abra as portas do entendimento e amemos os personagens da literatura; já não sabemos mais ler, já nos acostumamos com o frio das explicações puramente lógicas mesmo não havendo neve que nos esfrie o Natal no Brasil. Se tratamos o Papai Noel, o Coelhinho da Páscoa ou a Fada do Dente como alguém que existe ou não existe, já começamos muito mal! Afinal, faz algum sentido dizer que é mentira? 

Os mitos não são mentiras! Os mitos só existem se forem verdade. Os mitos são símbolos assim como as palavras o são, ou como o são os sinais de trânsito. Precisamos de símbolos não só para que nos comuniquemos com os outros, mas também conosmo mesmos; sem símbolos - sejam palavras, diagramas, ou imagens - não conseguimos pensar. Há realidades fáceis de serem simbolizadas como os entes individuais, principalmente aqueles que aprendemos na escola primária a classificar mineral, vegetal, animal. Há, contudo, certas coisas sobre as quais não podemos pensar só nos apropriando de símbolos simples como uma só palavra, uma só figura, uma só comparação ou outra figura de linguagem. Precisamos de histórias inteiras para isso, ou talvez de um afresco inteiro em uma parede, ou precisamos que alguém ponha uma barba branca, uma roupa vermelha e uma barriga postiça.



Todos os temas poéticos estão entrelaçados; não há como isolá-los, pois, a alma humana (que também é um dos temas) é uma só. Uma só também é a realidade onde tudo acontece por mais que só a compreendamos quando a repartimos na cabeça e isolamos cada das repartições as quais chamamos de temas, assuntos, áreas ou sei lá mais o quê. Até aqui já disse duas frases com palavras que não cabem num texto bem escrito por serem muito abstratas: tema, realidade, alma. Os poetas resolveram tudo isso por nós; encheram o mundo de seres fantásticos e mirabolantes para que pudéssemos tratar de coisas abstratas.

Quando começamos a falar, há palavras fáceis e palavras difíceis a serem aprendidas. As fáceis são aqueles monstros: um monstro é uma coisa que eu mostro. Vejam a cena: estamos andando por aí e aparece uma criatura extraordinária, nunca outrora vista, horrenda... a primeira coisa que o primeiro que a vir fará é apontar-lhe o dedo e dizer em latim: “Monstro!!!” que em português significa simplesmente “eu mostro”. E para mostrar usamos uma ferramenta admirável, o dedo. O dedo sempre ajudou o homem a criar palavras, mas somente palavras para os monstros, para aquilo que era possível de ser apontado. 

O dedo, este cetro embutido com o qual já nascemos e que impera os olhares de todos numa só direção; o mesmo dedo que coça o nariz e que toca uma sonata ao piano; com o dedo apontamos às coisas e vamos combinando uns com as outros: isto é uma pedra, aquilo é uma árvore, e ali há um morro. Pedra, árvore, morro são todos monstros mesmo que nós não os consideremos mais assim; já nos foram tantas vezes mostrados que paramos de prestar atenção e afundamos estas impressões no Hades da banalidade. Nós fazemos isso, mas os poetas parecem não serem como nós, pois continuam se impressionando com tudo que há de apontável e resgatam, ou quase o fazem, algo tão banal quanto Eurídice; vão às profundezas do reino de Plutão e voltam com algo que todos nós já vimos, já sentimos ou já vivemos e nos mostram tudo de novo e de novo; falam de passarinhos, de juncos, de pedrinhas, de riachinhos, de frutinhas, de tudo o que sempre esteve ali a ser por nós pisado como o sal que é jogado fora porque não salga mais.
Se é assim com as palavras fáceis, imagina o que os poetas podem fazer com as palavras difíceis. Podemos apontar para o amor, para o ódio, para a harmonia, para a discórdia? Eu, pelo menos, não vejo a ira, a caridade, a soberba ou fé num canto qualquer sempre passível de ser mostrada por alguém que sugira um nome para cada uma destas coisas. Por isso que cada uma dessas coisas é uma persona, um personagem a mais numa poesia que será lida por alguns que por sua vez poderão, a partir de então, usar essas palavras que não lhes foram mostradas não com o dedo, mas com a garganta de algum Aedo, Bardo, Trovador ou Rapsodo. 

E o Papai Noel? Noël é natal em francês; em Portugal, Pai Natal. Ele é uma persona, um personagem bem grande para que possamos apontar, mostrar algo invisível, intocável, um sentimento pagão dos magos do oriente que foram possuídos por uma vontade de conhecer a Verdade, de recebê-la de adorá-la. O Papai Noel é o espírito do natal personificado, vermelho bem chamativo, gordo, fácil de ver, de ouvir, de abraçar. A origem deste personagem em São Nicolau ou no folclore russo não importa aqui. Este gordo é a prova mais recente de que ainda somos homens que precisamos de poesia e mitos como os que há milênios precisaram contar histórias para que pudessem conhecer como homens e não como bestas.  

O Natal é o nascimento de Nosso Senhor, uma boa história mítica se não fosse pelo fato de que miraculosamente aconteceu no tempo e no espaço. Diante do fato do Natal, não temos palavras para exprimir o que acontece no nosso interior ao comemorarmos esta data histórica e criamos o mito do Papai Noel. Um mito pode ser contado e entendido por todos; falar de espírito de natal é só para os grandes especuladores metafísicos dos quais eu não faço parte. Deus cria a história com as próprias coisas e com nossas próprias vidas; o poeta imita a Deus ao criar um mito, pois obedece a Deus que mandou Adão dar nomes às coisas.

Clístenes Hafner Fernandes é presidente do Instituto Hugo de São Victor

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