Sem Aspas | Teus guerreiros, Nova Roma, onde estão? Pernambuco, imortal, imortal! – por Amanda Rocha
Durante meados do século XVIII
e início do século XIX, o sentimento nacionalista fortaleceu-se nos países da
Europa, logo após, essa emoção abraçou também as Américas. Nas artes, vivia-se
o apogeu do estilo Romântico, cujo nacionalismo ufanista produziu um dos mais
belos poemas brasileiros; escrito pelo maranhense Gonçalves Dias, Canção do
Exílio, é um louvor à Pátria e à natureza brasileira. Diversos poetas e
literatos se debruçaram em produções com esse caráter sentimentalista de amor
ao Brasil, no entanto, muitos deles olvidavam, em seus textos, dos problemas
sociais vivenciados pela população.
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Fabricio Macedo/Pixabay |
Vale frisar que o contexto
histórico desse período é marcado por revoluções, dentre as quais figuram a
Revolução Americana, Revolução Francesa e Revolução Belga. No Brasil, o
sentimento republicano impulsionado pelo idealismo iluminista resultou na
Inconfidência Mineira e na Conjuração Baiana. A Capitania de Pernambuco, a mais
rica e que já servira de palco para a Insurreição Pernambucana (século XVII) e
para a Guerra dos Mascates (início século XVIII) fora a única que conseguira
transpor a etapa da conspiração e alçar-se a uma Revolução que galgou êxito
entre 06 de março e 20 de maio de 1817, a chamada Revolução Pernambucana.
A chegada da Família Real
Portuguesa ao Brasil, em 1808, culminou em aumento de impostos, fato que
ocorreu concomitantemente a um difícil período de seca que reduziu a produção
de açúcar e algodão. A insatisfação dos grandes comerciantes e proprietários
com o pagamento de altos impostos, inclusive as taxas de iluminação pública do
Rio de Janeiro, capital do império na época, somada ao descontentamento de
juízes e militares pela nomeação de portugueses para altos cargos
administrativos e do Exército, acrescida ao aborrecimento de pequenos comerciantes,
artesãos e padres concluiu-se na proclamação da República, a qual estabeleceu a
liberdade de imprensa e de credo, o sistema dos três poderes e o aumento do
soldo dos soldados, embora mantivesse o trabalho escravo, esse último seu ponto
negativo.
Ao tomar conhecimento do que
ocorrera em Pernambuco, a Corte tratou de retaliar o movimento, o que se
tornara fácil devido às divisões internas. Houve o fechamento do Porto do
Recife e a reconquista do território do Rio Grande do Norte, Ceará e Paraíba,
assim, em pouco mais de dois meses a Revolução Pernambucana findou com a morte
ou prisão de seus líderes.
Muitas mudanças ocorreram
desde então, pouco tempo depois do ano de 1817, em 1822 o Brasil tem sua
independência proclamada e em 1889 um golpe estabelece a República. O que ao
longo dos anos não tem sofrido mudanças abruptas é o sentimento ufanista que
sopesa o coração dos pernambucanos, não é difícil ouvir um pernambucano
verbalizar com avidez seu amor por essa terra arretada, terra do frevo, do
forró e baião, de praias lindas, tantas são as belezas naturais de Pernambuco,
contudo, os problemas que estimularam a Revolução não foram tolhidos nos anos
seguintes, por contrário, ano após ano vê-se o ampliar dos impostos e a
precariedade dos serviços públicos.
O Estado de Pernambuco tem
altas taxas de ICMS e IPVA e, embora esbanje o alto índice da educação,
comparada aos outros estados do país, a infraestrutura da maioria das escolas é
inadequada para o funcionamento das Escolas de Referência e Escolas Técnicas,
as quais funcionam à custa de muito empenho das equipes gestoras e de docentes,
que se esforçam para superar o calor, o déficit de merenda, de material
didático, de salários abaixo do piso, dentre tantos outros problemas.
Na saúde, enfermeiros de toda
a rede faziam, até antes da crise do Covid-19, paralisação reivindicando
melhores condições de trabalho e salários dignos. A blitz da oposição por
diversas vezes frisou o caos instaurado nos hospitais públicos do Estado,
ausência de leitos em toda a rede pública estadual, longas filas de espera para
atendimentos médicos eletivos, higienização precária, etc.
Ainda sobre a crise promovida
pelo novo coronavírus muito se tem ouvido falar em restrições no Estado, o que
nesse momento de medo é um remédio bastante popular, a saber alguns: o
fechamento do comércio, a proibição de circulação de mototáxi, de reuniões
acima de 10 (dez) pessoas, paralisação das aulas, etc. As medidas são duras,
embora, parte delas deveras importante, no entanto, as ações de proteção ao micro
e pequeno empresário, aos autônomos, a população carente, ou se apresenta
precária ou sequer são apresentas.
No Recife, o Partido
Socialista Brasileiro escolheu um excelente momento para antecipar a cobrança
do IPTU, no entanto, as mídias pouco falam a respeito. Tornando ao cenário
estadual, não se ouve nada a respeito da redução ou adiamento do pagamento de
ICMS, nem mesmo para produtos que auxiliam na prevenção contra o vírus, como
álcool em gel, máscaras, luvas, etc. Quanto ao acréscimo de leitos propostos
(1000 leitos, sendo 400 para UTI) talvez sequer consigam atender a demanda já
superlotada dos hospitais. Para a Assistência Social a divisão de 1,4 milhão
para todos os municípios gera uma cifra risível para cada cidade.
Outra preocupação é a entrega
dos kits de merenda anunciados no momento de paralisação das aulas da rede de
ensino estadual como medida contra a propagação do vírus, o que o governador
parece esquecer é que milhares de alunos dependem da merenda que consomem na
escola e com o cerceamento das aulas, muitos não têm o que comer. Até o momento
não há nenhum pronunciamento do Governo, tão pouco cobranças do legislativo
nesse sentido.
O povo pernambucano tem hoje
motivos ainda mais graves que Cruz Cabugá e Domingos José Martins para
declararem uma revolução, logicamente os meios para galgar as transformações
sociais que ansiamos não necessariamente precisam trilhar os mesmos passos de
outrora. A principal mudança perpassa essencialmente pela compreensão dos
próprios pernambucanos sobre sua realidade, reconhecer seus algozes é um passo
essencial, não tornar herói seus malfeitores. É necessário que os pernambucanos
se ergam como bravos guerreiros conscientes, destemidos. Alcem-se como a guarda
avançada, sentinela indormida e sagrada, pois ainda não é hora de descansar
como um atleta depois da luta, ainda não chegaram os dias de glória. Liberdade!
Teus filhos ainda proclamarão e cantarão: Pernambuco, imortal, imortal. Que
Deus vos abençoe!
A indicação de leitura hoje é
A Moreninha, de Joaquim Manoel de Macedo.
Amanda
Rocha é professora e escritora
Como sempre muito bom. Estava com Saudades.
ResponderExcluirQue retrato!!! Parabéns, Amanda! Muito bom!👏👏👏
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