O
presidente da Aliança das Igrejas Evangélicas Congregacionais do
Brasil, Ismael Ornilo, que também é pastor da Igreja Evangélica
Congregacional Vale da Bênção da Vila Kennedy, em Caruaru/PE,
conversou com ConTexto sobre os rumos da igreja pós-pandemia.
Confira:
Como
o senhor analisa os impactos da pandemia na Igreja?
Eu
enxergo um impacto em todos os sentidos. O primeiro impacto é na
família, que foram obrigadas a se dividirem – as pessoas com mais
de 60 anos ficaram em casa, sem poder cultuar no templo. Então, como
igreja, temos de pensar como vamos assistir os idosos, que são
pessoas que amam muito a igreja, frequentam a igreja e consideram a
igreja como um lugar muito essencial. As crianças (de até 10 anos)
também sofreram impactos, pois têm de ficar em casa. Essa situação
também gerou um impacto financeiro nas igrejas, porque, se as
famílias estão sofrendo e a igreja é uma formação de famílias,
a igreja sofre também. Todo tipo de projeto missionário,
evangelístico ou mesmo de ampliação terão de se adaptar a uma
nova realidade, para assistir um grupo menor de pessoas, de maneira
responsável. Houve um impacto também de adaptação tecnológica.
Antes, nós pensávamos em cultuar presencialmente com um número
específico de membros. Hoje não é mais assim. As pessoas que estão
indo para a igreja é um grupo menor, mas há pessoas que estão em
casa que também precisam ser alcançadas pela mensagem. É
necessário ter uma linguagem que possa atingir outras pessoas, que
não são da igreja. É um número muito grande de adaptações.
Um
fator positivo é que, hoje, a igreja está atingindo muito mais
pessoas, por causa do fator tecnológico. Com os cultos on-line, nós
podemos chegar no mundo todo. O problema que vejo neste sentido é a
questão da mensagem. Penso que a igreja deve perceber qual é o
verdadeiro Evangelho e focar nele – perdão dos pecados,
relacionamento com Deus, relacionamento com Jesus Cristo –, ao
invés de uma vida de conforto e prosperidade material. Precisamos,
realmente, que as verdadeiras igrejas, os verdadeiros profetas, falem
do verdadeiro Evangelho. Espero que esta pandemia possa ensinar que o
verdadeiro Evangelho, focado na salvação de almas, esteja na boca
de todos os profetas de Deus.
Este
momento de pandemia também fez com que surgissem alguns ‘profetas
apocalípticos’, com aplicações das profecias de forma
sensacionalista. Como o senhor avalia este cenário?
A
Palavra diz que haverá o princípio das dores. O princípio das
dores não são as dores, são alertas da natureza. A natureza está
respondendo às agressões. A natureza é, também, uma trombeta do
Senhor, que está anunciando que alguma coisa está errada neste
planeta. Eu acho que este vírus é um contra-ataque da natureza, e
outros vírus também. A Bíblia fala que estes sinais são como
dores de parto, vão se intensificando, vão aumentando com o passar
do tempo.
Eu
não vejo que estejamos agora diante de um cenário apocalíptico
iminente. Existem algumas coisas que ainda não estão muito claras.
Em II Tessalonicenses, capítulo 02, diz que haverá dois sinais
muito claros quando o tempo final chegar. O primeiro deles é a
apostasia, o abandono da fé. As pessoas optarão por outro tipo
de fé. Eu vejo este sinal, mas não de forma muito clara. Eu vejo o
abandono do verdadeiro Evangelho em muitos casos, mas isso não é
uma apostasia muito clara. O outro sinal é a revelação do Filho
da Iniquidade, que se levanta contra tudo o que for relacionado a
Deus. Eu não entendo que isso seja relativo ao nome de Deus, mas do
que represente Deus. Então, quando esses sinais acontecerem,
saberemos que Ele estará às portas. Por enquanto, o que vejo são
princípios das dores. Sinais de que algo está para acontecer –
nós estamos agredindo a natureza, ela está respondendo a isso. Os
sinais das trombetas de Apocalipse são nas águas, no mar, nos céus,
ou seja, sinais na natureza que vão se intensificando, para que as
pessoas que são de Deus se voltem para o Criador e busquem proteger
a si mesmas e a suas famílias e ter uma vida em paz com Deus, com
fé, com amor, com esperança. Uma vida cheia de paz. O que
precisamos nos dias de hoje é paz. Independentemente se o mundo vai
acabar hoje, amanhã ou daqui a 100 anos, se estamos com Cristo
estamos seguros. Não devemos nos preocupar com o futuro. Se tivermos
uma vida em paz com Deus hoje, isso já é suficiente.
E
com relação às novas configurações da igreja. Mesmo após o
período de pandemia, o senhor acha que atividades virtuais
continuarão? As igrejas serão, ao mesmo tempo, presenciais e
on-line?
Sim.
Acho que não há como retornar. Percebemos de maneira muito clara
que a igreja hoje está sendo convocada para anunciar o Evangelho ao
mundo todo através desta ferramenta. Nossa mensagem já não é mais
para os que estão na vista do pregador, mas a mensagem profética
tem de ser para o mundo todo.
Porém,
existem mensagens que são mais amplas, mas outras têm implicações
eclesiológicas bem específicas. Como ficam essas distinções em
cultos transmitidos abertamente?
No
nosso caso, as igrejas congregacionais têm os cultos públicos e os
chamados cultos administrativos, que são assembleias de membros.
Estes são particulares, não são transmitidos, servem para a igreja
local – como uma família, quando se senta para tratar das suas
questões internas. Porém, as mensagens que a igreja tem segurança
de que são bíblicas, independentemente se outras igrejas têm uma
concepção diferente da nossa, a igreja terá de aprender que estas
questões eclesiológicas, relacionadas às formas de administrar as
questões dos templos, poderão ter diferenças; mas as questões
teológicas devem ser apresentadas de forma aberta.
Às
vezes, a gente acha que a Igreja Católica, por exemplo, tem
unicidade. Isso não é verdade. A unicidade da Igreja Católica
parte do pressuposto de que ela tem um líder, mas há conservadores,
há progressistas dentro da Igreja Católica; há espiritualidades
totalmente diferentes, como a franciscana e a beneditina, por
exemplo. Existem compreensões teológicas no sentido da salvação
diferentes. Uns acreditam que tem a ver com a libertação dos
pobres, outros dizem que isso tem a ver com uma relação com Deus.
Então, há diferenças dentro da Igreja Católica. No campo das
igrejas reformadas, evangélicas ou pentecostais, teremos de aprender
o que é essencial e o que não é, e aprender onde está a
verdadeira Mensagem, o que realmente o Senhor nos chamou a pregar.
Enquanto não aprendermos isso, estarão sendo pregadas outras
coisas, não o Evangelho, mas usando a Bíblia. Acredito que só o
Espírito Santo fará que as ovelhas de Cristo entendam onde está a
verdadeira chamada de Jesus Cristo. Quando a voz dEle ecoar, as
verdadeiras ovelhas vão ouvir Sua voz.
Há
igrejas que defendem que o membro deve se manter fiel à denominação
em que estão, mesmo se tiverem de se ausentar da igreja local. Como
o senhor observa este tipo de norma?
Não
entendemos que a fidelidade a Cristo corresponda a uma fidelidade
denominacional. Como igrejas congregacionais, entendemos que uma
igreja verdadeira tem três marcas. A primeira é a
pregação do verdadeiro Evangelho, o qual ensina que para o homem se
relacionar com Deus precisa se arrepender dos seus pecados e crer no
Evangelho, tendo como maior benefício o perdão dos seus pecados. O
verdadeiro Evangelho proclama uma vida de paz com Deus e perdão dos
pecados. A segunda marca é a responsável aplicação dos
sacramentos: o batismo e a ceia. A igreja tem cuidado com as pessoas
que dizem ter se arrependido e querem se batizar, cuidando desta
entrada das pessoas, ensinando-as; e se cuida da mesa da Ceia do
Senhor, não permitindo que ela seja proclamada. O terceiro
sinal é a disciplina. Ou seja, se a igreja vir que alguém estiver
andando de forma desordenada, o tal é chamado, orientado, cuidado, e
se quiser se manter de forma desordenada, é afastado da comunhão,
então, é uma boa igreja, mesmo se for Batista, Presbiteriana ou
Assembleia de Deus.
Quanto
às pessoas que precisem se mudar de cidade, estado ou país e
queiram permanecer membro de uma igreja anterior, isso é possível?
Sim.
Temos membros em nossa igreja que estão em lugares distantes. Há
membros que estão no Recife, em Salgueiro e Serra Talhada, por
exemplo. São irmãos que não querem se desvincular da sede.
Frequentam igrejas locais onde estão. Hoje, com o advento dos cultos
serem transmitidos, assistem-nos pela internet. Entregam dízimos e
ofertas na igreja-sede, porque confiam que os recursos são bem
administrados, aplicados nos locais certos, com uma diretoria eleita
para este fim. Os membros da igreja local onde pastoreio sabem que a
cada dois anos há uma diretoria administrativa, com recursos
específicos para missões, para a área social – nenhum membro
desta igreja pode passar necessidade, os pastores não mexem com
dinheiro. Os pastores são presidentes da diretoria administrativa,
pedem relatórios e cobram atividades, mas a função dos pastores é
pastorear o rebanho e a obra missionária. Quando os membros daqui
veem esta realidade, mesmo quando saem querem continuar vinculados.
Acho que isso tem a ver com confiança.
Qual
seria a mensagem mais importante para este momento que estamos
vivenciando?
A
mensagem que temos de ter neste dia é de gratidão, esperança e
solidariedade. Gratidão porque, apesar desta pandemia, se
você está lendo esta entrevista agora, Deus poupou você. São mais
de 80 mil mortos hoje. Apesar de ter levado algumas pessoas que amei
e ainda amo em minha memória, Deus me poupou e eu tenho a
responsabilidade de fazer o bem aqui na terra. Digo que temos de ter
esperança porque, se Deus nos disciplinou para valorizarmos o
que realmente tem valor em meio a esta pandemia, mas se as coisas
estão prestes a voltar – existem, pelo menos, três vacinas em
fase de experimentação, temos de ter esperança de que Deus está
nos dando uma nova chance. Quando pudermos voltar, temos a obrigação
de sermos pessoas melhores – perdoando mais, valorizando abraços,
sorrisos. E eu acho que a humanidade precisa perceber que se formos
egoístas não vamos escapar, temos de ser solidários. A
gente precisa olhar de lado, dividir o que a gente tem com quem não
tem. Se a humanidade for solidária, vamos vender qualquer
tempestade, qualquer guerra, qualquer pandemia. Acredito que o
Criador nos permite passar por algumas situações para que possamos
perceber que somos seres que devem viver em comunidade. O
individualismo vai matar a humanidade; a solidariedade vai salvá-la.
Então, divida sua dispensa com os mais pobres; divida seu sorriso,
seu talento, suas competências com o mundo. Se formos assim,
acredito que teremos aprendido com esta pandemia. Quem sabe Deus dê
mais alguns anos à humanidade, sem que tenhamos nos autodestruído.
Por
Jénerson Alves
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