Era domingo. Como de costume, Tiago ia para a casa da avó. Quando se tem sete anos de idade, a casa da vó pode ser um paraíso. Doces, mimos, afagos. Uma coisa mais chamava a atenção do menino: havia uma réplica do mais famoso quadro de Da Vinci, A Última Ceia, fixada na parede da sala. O menino passava horas analisando a obra. Observava cada detalhe. Seus olhos infantis eram minuciosos. Cores, traços, luzes.
Tiago não sabia das teorias sobre símbolos ocultos presentes na tela. Ele não sabia dos anacronismos na pintura, como o formato da mesa, que não coincide com o que era utilizado no mundo judaico do primeiro século. Aliás, o garoto sequer sabia o nome dos apóstolos ou mesmo que a pintura reproduzia um trecho dos Evangelhos. Seus pais não o levavam a nenhum templo. Ele não conhecia Escola Bíblica, tampouco Catecismo. Só conhecia aquele quadro, que poderia se confundir com qualquer outro ornamento da casa.
Por incomum que pareça, ele gostava de fitar os pães sobre a mesa. É claro que a criança não sabia do episódio em que o Senhor dissera: “Non in solo pane vivit homo, sed in omni verbo, quod procedit de ore Dei”. Muito menos da revelação de Quem declarou: “Ego sum panis vitae”. Tampouco sabia que Aquele que seria crucificado, quando da última ceia, pegou o pão e falou: “Hoc est corpus meum”.
Mesmo sem saber, o garoto sentia. Não era um homem qualquer em uma pintura qualquer. Ali havia um Símbolo, um elemento do Alto lançado na terra, uma faísca que ilumina a caverna. O Pão que sacia a fome de amor. Uma mensagem que só quem tem olhos de criança consegue entender.
Texto: Jénerson Alves
Imagem: A Última Ceia, de Leonardo Da Vinci
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